[Conto] Three leaf clover.

by - novembro 28, 2014

P1 - O início.


♣Atualmente

Thomas ~


Aqui estou eu olhando através da janela do meu apartamento as ruas molhadas de Londres, a pouco a chuva terminou e o tempo agora estava realmente lindo, feito para correr pelas ruas ‘batendo um pique’ com os amigos eu sinto falta disso, sinto falta desses momentos da infância, momentos em que a única coisa que importava era a bronca que você iria levar da sua mãe por chegar em casa sujo, aqueles dias com certeza foram os melhores.
Naqueles dias Peter ainda era um menino frágil e necessitava desesperadamente da nossa proteção, minha e do Lucas.
Naqueles dias eu e Lucas brigávamos por qualquer coisa mas nos perdoávamos logo por que não dava para viver um sem o outro.
Naqueles dias eu, Thomas Bell ainda era um policial que usava uma arma de brinquedo.
Naqueles dias a única coisa que a gente queria de verdade era se divertir.
As imagens continuam passando pela minha cabeça, as lembranças e o coração dói, ao lembrar de tudo que aconteceu e de como nossos caminhos foram separados.
A lembrança daqueles dias era a coisa mais preciosa que eu tinha.

♣12 anos antes

Eu estava em casa assistindo meu desenho favorito quando ouvi a voz do meu melhor amigo me gritando desesperadamente, corri logo pra janela, me debrucei e perguntei:
_O que foi Lucas? Você não pode mesmo resolver um problema sozinho não é?
_Não é isso. – Ele disse franzindo a sombra celha – Não fique se achando, olha isso.
Ele colocou Peter para frente, o pobrezinho que tinha 8 anos tremia feito vara verde e tinha os olhos vermelhos encharcados de água. Eu imediatamente pulei a janela e perguntei ao mais novo:
_O que aconteceu Peter? – Perguntei preocupado.
_O ... os ... os ... os ... – Pedro chorava e não conseguia responder de tanto que soluçava.
_Os meninos da turma do Joel bateram nele de novo. – Lucas disse demonstrando claramente a raiva em seus olhos.
_Bateram? Mas porque Peter? – Perguntei novamente a ele, mas o mais novo não conseguiu responder, estava nervosos demais.
_Está certo Thomas, viu que não adianta conversar com ele, o que adianta é agente ir lá e quebrar a cara daquele trio metido a besta, quem eles pensam que são? – Lucas bufava enquanto dizia isso.
_Lucas não podemos bater neles, eles são três e nós somos dois. – Eu disse, sempre fui o mais racional.
_Sim, mas eu sou mais velho do que aqueles amigos idiotas dele, acabo com aquele dois em um segundo.
_A e eu fico com o Joel? – Arregalei meus olhos.
_Exatamente, vamos. - Lucas me puxou pela camisa e lá fomos nós dois, o Peter se escondeu atrás de uma parede enquanto acertávamos as contas com o metido do Joel e sua mini gangue, eu ainda ouço o barulho de cada soco que o Lucas dava no rosto dos mais novos, e aquela foi a primeira vez que eu briguei na rua, bom na verdade foi a primeira vez que eu briguei, senti como se aquele dia fosse o responsável por me tornar um homem de verdade, porque aquela foi a primeira vez que eu quis fazer justiça e mesmo sendo contra qualquer tipo de violência daquela forma eu senti como se estivesse ajudando uma pessoa que precisava muito de mim.
Peter precisou da nossa proteção naquele momento, tínhamos que mostrar para os valentões que ele não estava sozinho, ele era um menino muito frágil e precisava que eu brigasse por ele, outro motivo para que eu criasse coragem naquele momento foi o fato do Lucas estar ali comigo, ele era tão destemido e corajoso, gritava sem parar ‘isso Thomas, bate mais, bate que ele merece, lembra o que ele fez com o nosso amigo? Ele merece sim, bate mais e com vontade’, é por isso que até hoje eu sinto que me tornei mais forte.
A nossa amizade crescia cada dia mais, éramos como os membros do corpo que não podem se separar senão o corpo não é perfeito, mas todo mundo dizia que nós três éramos como um simples trevo, sabe um trevo aquela folhinha de três folhas, que se tiver quatro folhas dizem que traz sorte, por isso os adultos diziam que nós éramos como um trevo, mas de três folhas mesmo, deve ser porque agente aprontava demais, quer dizer o Lucas aprontava demais eu e o Peter só levávamos a culpa junto com ele, mas agente nunca se chateava porque era engraçado sair correndo do mercado com algumas goiabas escondidas debaixo da blusa e depois ver a cara do Lucas dizendo pra mãe dele que tinha trabalhado duro e comprado as frutas pra ela.
Ele sempre gostou de mentir.
Eu não o culpo ele vivia só com a mãe e ela andava mesmo doente naqueles dias, mas o Lucas animava ela com suas historias, historias que eu e o Peter adorávamos ouvir mesmo sabendo que eram mentiras e como ele e a mãe eram muito pobres Lucas roubava mesmo, pra levar um pouco de comida pra casa, Peter e eu tentávamos ajudar, mas ele sempre foi orgulhoso demais.
“Eu nunca aceitaria nada assim de vocês”.
Ele dizia, mas eu acho que ele teria aceito, pelo menos algum dinheiro para remédios se soubesse que a mãe ia morrer em pouco menos de dois anos. Já que de acordo com o pai do Peter a doença poderia ter sido evitada.
O pai do Peter era médico, sim a família dele tinha bastante dinheiro, mas Peter nunca foi um menino de se gabar muito pelo contrario ele andava de um lado pro outro tirando fotos e mais fotos de tudo que encontrava pela frente, ele amava aquilo, sem saber que ganharia muito dinheiro com isso no futuro, mas como eu já disse Peter não ligava para o dinheiro, nunca ligou. Ele dizia que trocaria todo dinheiro do mundo para ter eu e o Lucas do lado dele pra sempre, “para te proteger, cagão” Lucas dizia bagunçando o cabelo do nosso caçula ele ria e concordava, mas um dia ele me contou, três anos mais tarde ele me contou que não era por causa disso.

♣10 anos antes

26 de Julho e parecia que não ia parar de chover nunca mais, eu não saia da janela da sala pensando no trevo ... um trevo comum de três folhas quando se tira uma parte de uma folha é impossível uni-la novamente, e deixar tudo como estava antes.
Tudo estava acontecendo, Julho não estava sendo mesmo um bom mês, a duas semanas o Lucas tinha batido na casa do Peter desesperado dizendo que a mãe estava passando muito mal e nesse mesmo dia o pai do Peter disse para ele que ela estava morta, foi um choque. Eu percebi em seu olhar que ele se sentiu a pessoa mais sozinha do mundo naquele momento e eu não sabia o que podia fazer, então o abracei bem forte e disse que estava com ele mesmo assim ele só reagiu duas semanas mais tarde.
Sabe, Lucas estava morando com a minha família e eu estava amando a ideia de tê-lo como irmão, mesmo que ele não estivesse falando muito naqueles dias eu sabia que ele ia se recupera todo mundo se recupera um dia desse tipo de coisa, mas metade das coisas que eu imaginei agente fazendo junto não aconteceu mais, porque no dia 25 as 10 horas ligaram do conselho dizendo que os avós dele que moravam na Itália tinham entrado em contato e ele deveria ser mandado pra lá imediatamente.
O choque foi tão grande para mim e quando os meus pais contaram pra ele naquela mesma tarde eu percebi que não era aquilo que ele queria, mas o que o Lucas queria ou não já nem importava a vontade dele não iria ser feita, o conselho quase nunca se importa com a vontade da criança ou do adolescente e eu estava no quarto com ele, quando o vi começar a chorar.
_Deve ser por causa dos roubos Thomas. - Ele disse de cabeça baixa enquanto colocava as roupas na mala, sua voz não era a voz decidida de sempre era uma voz longe e triste, melancólica e chorosa - Eu nunca fui muito bom para ela, e para vocês também não por isso estão me tirando, essas coisas ... – ele parou de colocar a roupa na mala.
Eu estava encostado na porta e vi quando ele sentou na cama e desabou de verdade. Nunca pensei que o veria chorar desse jeito, nunca, aquela cena era uma cena que eu não gostaria de presenciar, a pessoas que eu considerava a mais forte e corajosa do mundo desabava bem na minha frente, no final as lágrimas vieram.
_Não chora assim Lucas. – Eu disse tentando acalmar as coisas e me sentei ao lado dele. – Sabe, agente ainda vai se ver de novo, a Itália não é muito longe.
Ele soltou um pequeno riso quando eu disse isso e enxugando as lagrimas se virou pra mim e disse:
_Não era para eu estar chorando desse jeito, ainda mais na sua frente.
_Não, tudo bem você pode chorar a vontade, nós somos amigos não é?
Ele balançou a cabeça positivamente.
_Então ... – Eu continuei, mas fui interrompido por um forte abraço que eu recebi do Lucas, foi o abraço mais caloroso e com mais sentimento que eu já tinha recebido, nem minha própria mãe tivera me abraçado com tanta ternura antes, ele então disse a frase que mais me marcou e que praticamente me transformou naquilo que eu sou hoje.
“Você trata de crescer Thomas e lutar por aquilo que você acredita, porque um dia agente vai se encontrar de novo e eu quero ficar contente em saber que você é um homem descente, com uma família bonita e um emprego danado de bom, e esquece essa coisa de amigos está certo? Nós não somos mais amigos a muito tempo, pelo menos pra mim nós somos irmãos de verdade”.
Ele sorriu depois que disse isso, até que ouvimos a voz do Peter nos gritando lá em baixo, fomos até a janela do quarto e o pequeno estava lá com a câmera pendurada no pescoço, ele perguntou:
_Vamos tirar umas fotos juntos?
Tadinho, nem sabia que ia passar a tarde toda chorando depois que agente contasse que o Lucas ia embora, e ele foi ...
Foi embora naquela tarde chuvosa do dia 26; na estação de trem estávamos eu, mamãe, papai, uma moça do conselho, Peter e o Lucas que segurava uma única mala com algumas peças de roupa e outros bagulhos que a minha mãe tinha dado a ele.
Ela fez todas as recomendações do mundo como se estivesse falando comigo. A mulher do Conselho só olhava no relógio toda hora e repetia “esse trem não vai sair?”.
Peter várias vezes mostrou a língua pra ela sem ela perceber, eu garanto que percebeu uma vez, mas achou melhor disfarçar e fingir que não, essa gente fingida me da nos nervos.
Finalmente o trem apitou e de imediato o Peter agarrou na cintura do Lucas chorando desesperadamente, “Não, não vai por favor não vai.” ele repetia sem cessar, Lucas com certeza não queria, mas estava sendo forçado do mesmo jeito que o Peter foi forçado a soltar o abraço, para acalma-lo o mais velho disse: “Peter a gente vai se ver de novo, mas se esforce, seja um bom menino e me deixe orgulhosos está certo?” ele bagunçava o cabelo do pequeno e fazia força pra não chorar, Peter apenas consentia com a cabeça, Lucas então se virou pra mim “Cuida dele.” ele disse, e eu respondi “Com certeza e você se cuida”. Ele consentiu sorrindo e colocou na minha mão um trevo em perfeito estado, ele me olhou e disse: “Nenhuma parte do trevo vai ser arrancada Thomas.” e entrou no trem.
Ele acenava e eu podia sentir o que ele disse, parecia mesmo que nenhuma parte do trevo tinha se partido ele ainda estava ali e era melhor eu contar logo isso para o Peter, antes que ele inundasse toda estação com suas lágrimas.
_Peter não chora, o Lucas ... agente vai ver ele de novo, e eu estou aqui pra proteger você.
_Não é isso Thomas, não é a proteção. – Ele disse.
_É o que então? – Eu parei na frente dele perguntando.
_Vocês dois são os melhores amigos da minha vida, é o que eu mais tenho de precioso vale mais do que todo ouro do mundo e eu sempre imaginei nos três velhinhos como o meu avô e os amigos dele, jogando dama na varanda lá de casa, e agora... – Mais choro.
_Vai acontecer. – Eu disse e ele me olhou com aquele olhar de esperança. – Se agente tiver fé vamos vê-lo de novo, o destino vai nos unir novamente.
E iria mesmo.
Dez anos mais tarde, mas não do jeito que eu imaginei que iria ser, acho que é sempre assim né? Nada acontece do jeito que a gente imagina que vai acontecer.

CONTINUA ...



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